Posso afirmar que o sentimento
que tem me assolado nos últimos dias é de RESSACA. É como se tivesse me
embriagado por uma estética disforme, desfigurada, de um cenário trash, no qual eu me sinto uma intrusa
ao mesmo tempo em que percebo que sou mais um dos coadjuvantes dessa “cena”
chamada de Leopoldina, que como dizia o músico poeta*: “(...) sonora verdade
(...) minha cidade”.
Não consigo no momento cantar
todos os versos, pois seria por demais contraditório, no presente “ato”, dizer
“mineira gostosa”, mas não me furtaria em destacar entre os versos a
inspiradora constatação: “alienada em função do futuro (...)”.
Por que não “mineira gostosa”?
Porque uma cidade em que lixos espalhados passaram a ser rotina em todos os bairros,
ruas, cantos, disputados por cachorros e por jovens em brincadeiras nada
agradáveis, não pode ser “gostosa”. Porque uma cidade em que os buracos são
constantes nas ruas e nas calçadas, isso quando se tem calçadas, não pode ser
“gostosa”. Porque uma cidade em que decepam árvores, arrancam história,
desprezam a cultura e o patrimônio, não pode ser “gostosa”.
Fui surpreendida, há dias atrás, com
uma cena que tem reverberado em minha memória e as vezes de súbito ela transborda
em minha mente. Com isso percebi que precisava compartilhar o ocorrido e minhas indagações. Estava eu
passando pela Rua Barão de Cotegipe, neste Município de Leopoldina, num início
de noite quando ao parar pra conversar com amigas em frente a Casa/Museu em que
viveu o poeta Augusto dos Anjos, percebi uma movimentação de pessoas, que pouco
a pouco se dirigiam a árvore que existe em frente a referida casa e depositavam
ali, aos seus pés, um saco de lixo. E quando me voltei para a árvore percebi
que a base de seu tronco foi tomada por lixo. Foi quando uma das amigas chamou
a atenção para observarmos as demais árvores da rua, em frente a outros
logradouros e assim constatamos que não haviam sacos de lixo aos pés de outras
árvores, ou seja, o local “escolhido” pelas pessoas para depositar o lixo foi
exatamente na árvore em frente a única Casa/Museu que temos na cidade, uma das
nossas referências patrimoniais, símbolo da cultura leopoldinense, reconhecida
em inúmeros lugares, pelo importante acervo histórico e material do poeta
paraibano Augusto dos Anjos.
Desde então venho me indagando
sobre o significado desse ato. O quê realmente isso nos diz? Seria aquela “Casa”
invisível às pessoas? Por que exatamente ali seria o local de colocar o lixo?
Qual a representação simbólica daquele lugar, daquele espaço para as pessoas?
Ou será que na verdade ela não representa nada para as pessoas, ao ponto de não
ser percebida na sua qualidade de ícone da cultura local? Seria ela para as
pessoas uma simples casa velha, em que não mora ninguém, por isso seria
permitido depositarem ali o lixo? Outra hipótese que pensei é que talvez pela
iluminação em frente a casa entenderam ser um bom local para colocar os sacos
de lixo para a coleta pelos lixeiros e desavisadamente não teriam percebido que
estão “promovendo” a Casa, em que o poeta Augusto dos Anjos passou seus últimos
dias, a lixeira da rua. Percebi que tudo isso produziu em mim um misto de
indignação, com admiração e até mesmo um silêncio profundo que me congelou e
precisei de alguns dias pra conseguir soltar minha voz e falar sobre isso.
O que acontece na Leopoldina em
que vivemos? O que estamos produzindo? Qual é nossa verdadeira tradição e o que
é cultura pra nós? E por fim, por que jogam lixo em frente a Casa/Museu em que
viveu o poeta Augusto dos Anjos????
*(Fragmentos dos versos do Músico/Poeta: Serginho do Rock)
*(Fragmentos dos versos do Músico/Poeta: Serginho do Rock)
4 comentários:
É muito triste constatar a pouca educação do nosso povo.Lamento profundamente,mas é necessário uma campanha acirrada de conscientização e aliada a esta iniciativa medidas severas como por exemplo: multar. Isto criará outro problema:fiscalizar.A cidade merece um carinho maior da população que ainda não descobriu o valor da preservação
Sou uma carioca que morei por alguns anos de Leopoldina e pude conviver e conhecer um pouco da história do poeta Augusto dos Anjos. Acho que uma cidade como Leopoldina, que conheci limpa e bela, já não consegue passar esse encanto para os que chegam em suas terras. saudades da minha pequena Leopoldina.
Realmente, conforme disseram o encantamento parece ter se perdido, a cidade anda bem mal cuidada e essa falta de cuidado não é só em relação ao poder público, mas de toda a população, hoje o que vemos pelas ruas é muito lixo e cada um olhando pra si sem a responsabilidade de compartilhar os espaços na coletividade
Cultura, Cláudia, é o que falta às pessoas de qualquer cidade. Falta a consciência de que a rua também deve ser cuidada. O problema é que as crianças não são ensinadas a preservar e por isso tornam-se adultos insensíveis.
A Casa Museu de Augusto dos Anjos, infelizmente, não é vista pela população local com os mesmos olhos seus - e nem os meus. Para ela, é só uma casa.
Falta cultura; falta consciência. Os pais não ensinaram; e a escola também não.
Adorei seu blog. Você escreve muito bem. Está nos meus favoritos.
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