segunda-feira, 18 de abril de 2016

50 ANOS

Há exatos cinqüenta anos, também numa segunda-feira, em 18 de abril do ano de 1966 eu chegava a este mundo, nesta Terra, neste planeta, neste Tempo.

Nasci na efervescência dos anos 60 no Brasil, em meio a ditadura militar pós golpe de 64, num ano em que foi instituído, pelo Ato Institucional nº 3, as eleições indiretas para governador, vice-governador e a nomeação de prefeitos. Em 12 Estados, a ditadura sai vitoriosa. Em Minas Gerais, Estado em que resido, Israel Pinheiro tomava posse como governador e entrou para a história como pioneiro da indústria siderúrgica nacional. A UNE faz seu segundo Congresso na ilegalidade e na Praia Vermelha, no Rio de Janeiro, a PM invade a faculdade de Medicina e espanca os estudantes. Sai a condenação de 14 anos de prisão para Luis Carlos Prestes, líder do Partido Comunista Brasileiro. Artur da Costa e Silva, candidato da Aliança Renovadora Nacional (ARENA) é eleito Presidente do Brasil, pelo Congresso Nacional, em eleição indireta, após ter sofrido um atentado a bomba em Recife, em que três morreram. São criados o INPS, o FGTS, a EMBRATUR, o IOF, entre outros e em dezembro, o Congresso, após a cassação de vários deputados e o recesso de um mês, é compelido a votar a “Constituição de Castelo”, ainda com Castelo Branco na presidência. Mas a oposição lança no Rio de Janeiro a Frente Ampla, antiditadura, unindo Lacerda, Juscelino e João Goulart e posteriormente, JK e Lacerda, lançam em Lisboa o Manifesto Oposicionista.
 
Um ano já bem agitado no Brasil pela pressão da ditadura, e toda a movimentação da oposição, que resistia e já sofria suas “baixas”, com corpos boiando nos rios, como o caso do corpo do sargento Manoel Raimundo Soares, preso pela ditadura no Rio Grande do Sul e que apareceu boiando com sinais de tortura no Rio Jacuí. Um mês depois o Marechal Amaury Kruel deixa o 2º Exército com manifesto de crítica ao regime militar. E dois anos depois, em 1968, chegamos ao fatídico Ato Institucional nº 5 (AI 5), em que os militares decretaram o recesso por tempo indeterminado do Congresso Nacional e assumem de vez todo o rigor, repressão e truculência de um regime militar ditatorial. E a palavra de ordem que se institucionaliza é o “CALE-SE”.

Esse foi o cenário da minha chegada ao Brasil, nascendo no Rio de Janeiro, pra morar na Rua Campinas, no Bairro do Grajaú, tendo como meus fiéis e dignos tutores, meu pai Jorge e minha mãe Maria José. Tive a minha formação básica na escola em meio as campanhas militares da década de 70, através da mídia principalmente, em que cantávamos: “Crianças somos do Brasil, vivemos sob um céu de anil, pinguinhos de gente valente (...) do Brasil somos as crianças, do Brasil somos a esperança (...), no futuro por sua grandeza, viveremos com riqueza”. Me lembra Affonso Romano de Sant’Anna (1980) no seu poema/ícone Que País é este?: “(...) Usei caderno ‘Avante’ – e desfilei de tênis para o ditador. Vinha de um ‘berço esplêndido’ para um ‘futuro radioso’ e éramos maiores em tudo – discursando rios e pretensão”.


Mas nesses cinquenta anos de história, fui agraciada com muitos encontros, com pessoas, idéias... Tive o privilégio de conviver com quem passou pelos porões da ditadura, com quem trazia consigo as marcas e a chama acesa da resistência, da luta pela liberdade, da livre expressão, da conquista pelo exercício político democrático, para um Estado pleno de Direitos, mesmo que em muitos momentos eu fosse meio que a mascote da turma. Mas pude viver, conviver e transitar em meio a esses movimentos e todas as experiências que a vida me proporcionou, tudo o que a Escola me legou, me oportunizaram a formação de um consciência crítica, humanitária e ética – experiência que acredito ter compartilhado com muitos de minha geração.

Hoje, 18 de abril de 2016, acordo com meus 50 anos – meio século de vida – experimentando algumas das angústias que no ano em que nasci, muitas pessoas experimentaram. Incertezas em relação ao futuro de nossa Nação, uma eleição indireta para presidente camuflada de defesa constitucional e a ditadura militar sendo calorosamente saudada como exemplo de conduta moral, ética, em defesa dos “bons costumes”, da família, tradição e pátria (TFP). Na sessão plenária de ontem, no Congresso Nacional, vi até mesmo deputados falando em nome dos ideais da Revolução Francesa, falaram em nome de tantos, de tanta coisa, que acho que não se lembraram de falar em nome de si mesmo. Percebi mais uma vez que nossos representantes no legislativo, em sua grande maioria, não se comprometem, se isentam de si se auto acobertando em meio a uma falácia sem fim. Se vivemos 50 anos pra chegarmos a esse momento, me parece que o caminho ainda será longo até o exercício pleno de uma democracia limpa, transparente, em que o interesse seja comum, ou seja, verdadeiramente o povo brasileiro, pois o que vivemos, são disputas pessoais, interesses pessoais, vaidades, disputas de poder, ganância financeira e muito despreparo intelectual, emocional e espiritual.
 
Mas gostei de conhecer um pouco mais dessas pessoas e sou grata por essa vivência, por “viver” essa história, que pra mim, se caracteriza por uma transição. Estamos juntos nesse trânsito, assim como está todo o nosso planeta. O que vai advir disso, só o Tempo nos dirá. Se a mim foi me reservado esse testemunho, agradeço e como boa aprendiz que sempre tentei ser, me coloco aberta a aprendizagem e a semeadura das boas sementes que eu for digna de cultivar.